top of page

A TRAGÉDIA DE PETRÓPOLIS – UMA LIÇÃO NÃO APRENDIDA

URBANISMO E EVOLUÇÃO DAS CIDADES


RONALDO ALVES*


Essa tragédia ocorrida semana passada em Petrópolis, contabilizando até agora mais de 130 vítimas fatais, consolida uma situação que se vivencia desde a década de 60 nas regiões serranas do RJ, inclusive o acidente de tromba d’água de 1966 na Serra das Araras, em nossa região. Mas temos outra referência de 2011 em Friburgo, no mesmo grupo da Serra dos Órgãos a poucos km de Petrópolis, quando uma trágica tromba d’água matou mais de 900 pessoas e a correnteza destruiu casas, veículos, arvores frondosas, em mais de 200 deslizamentos de terras nas encostas ocupadas pela população desassistida como se verifica em toda aquela Região.

Aí vem a pergunta: porque isso ocorre e porque cada episódio desses não serve de lição para uma política reparadora e preventiva para que não mais se repita? A natureza impõe seu estigma. Ela sempre será implacável em função das condições meteorológicas, muitas vezes fruto do desequilíbrio do clima em todo o Planeta.

As ajudas humanitárias para os casos críticos, que chegam às toneladas vindas de todo o País e até do exterior, servirão apenas para amenizar a dor e a instabilidade de famílias sobreviventes, por algum tempo. Mas e depois???

Aí é que se situa o desleixo, a falta de visão e de conhecimento das políticas públicas que poderiam estar sendo empreendidas não só ali, mas em diversos locais no país, onde ano após ano, as catástrofes se sucedem com vítimas humanas e prejuízos materiais.

Porque as famílias se instalam em locais de risco como esses que ora assistimos, muitas das vezes ou, em quase todas, sem oposição do poder público que nada faz para impedir o futuro desastre? São muitas as respostas mas, a principal delas é a falta de alternativas à moradia própria das pessoas de baixa renda, em vista da baixa capacidade de adquirir um imóvel ou mesmo pagar um aluguel por menor que seja. Ocupar um espaço numa encosta de morro se apresenta como a única saída para a moradia sem custo ou de baixo custo. Primeiro um barraco de tábuas ou até mesmo papelão. Aos poucos mais uma casa de madeira ou mesmo alvenaria vai surgir no emanharado subnormal de um bairro popular não planejado e irregular perante o poder público.

E do ponto de vista do poder Público que conhece (ou deveria conhecer) os riscos de construir em encostas de morros sujeitos a acidentes da natureza desse atual de Petrópolis ou daquele de Friburgo em 2011? Não precisa ir longe. Toda Prefeitura tem pelo menos um arquiteto ou engenheiro capaz de fazer um diagnóstico rápido das áreas do Município onde não se deve ocupar com habitações e/ou comércio. Mas porque eles não são ouvidos ou não são usados para orientar as famílias sobre os riscos futuros naquele local?

Bem, esse é um lado da questão, mas não é o principal deles, pois ao poder público cabe constitucionalmente zelar por saúde, educação, trabalho, transporte, lazer e HABITAÇÃO, este último pouco ou quase nada considerado nas políticas públicas vigentes nos Municípios. Deveria ser o principal item orçamentário de um governo, visando proporcionar à comunidade a principal função da vida: HABITAR!! Sem habitação ninguém vive com segurança e com estabilidade emocional para trabalhar, constituir família e gozar dos prazeres da vida.

Todo Município deveria ter em prioridade uma política habitacional PERMANENTE, voltada para aqueles que não dispões de condições de ter a casa própria com seus próprios recursos. Ao impedir a ocupação de áreas de risco, o poder público deve ter em seu planejamento, em paralelo, a oferta de habitação popular de baixo custo, em áreas não sujeitas aos acidentes da natureza. Encostas, beira de rios, terrenos alagadiços e outros. Quando não tem essa política como prioridade, a ocorrência de ocupações irregulares, principalmente em áreas sujeitas a acidentes naturais, é o que prevalece.

Causa repulsa verificar que muitos Municípios se veem em situação de tragédias como essas citadas, por absoluto descaso para com políticas de atendimento social necessárias prioritariamente. Não faltam Urbanistas para ditar essas políticas e nem engenheiros para diagnosticar as áreas de risco sujeitas a deslizamento de terras e queda de barreiras com material pesado de rochas e barro.

Que esse desastre finalmente sirva de lição e permita uma política nova no País voltada para atendimento das classes menos favorecidas, desconectada das imposições do mercado imobiliário de das forças econômicas dominantes.


Esperamos que na próxima semana esteja funcionando a Câmara Municipal colocando em pauta a Revisão do Plano Diretor que já está comemorando 14 anos de sua edição de 2008. Excelente oportunidade para que os senhores vereadores tomem essa atitude histórica de fazer do Plano Diretor um instrumento mais eficaz ainda de ordenar as funções sociais da propriedade.


Ronaldo Alves é arquiteto e urbanista


Comments

Rated 0 out of 5 stars.
No ratings yet

Add a rating
Anúncio Geleias.jpg

Postagens Recentes

® Copyright
bottom of page